24/02/2023 às 15h14min - Atualizada em 24/02/2023 às 15h14min

“Não existe muita água para pouca cidade. O que existe é falta de ação de longo prazo”, diz Greenpeace Brasil

O poder público deve preparar as cidades contra eventos extremos e parar de agir apenas na tragédia.

Redação
Foto: Mar Franz/Greenpeace Brasil – Trabalho da Defesa Civil junto com os moradores em São Sebastião – SP
No último domingo (19), fortes chuvas causaram uma tragédia no litoral norte de São Paulo, com óbitos, deslizamentos de encostas, alagamentos, perdas materiais e centenas de pessoas desabrigadas. Segundo dados divulgados pela Defesa Civil nesta sexta-feira (24), foram contabilizadas 54 mortes, mas os números seguem em análise, com risco de subnotificação. Apesar da visita do governo federal na região, a sua colaboração com o governo estadual e prefeituras, e do anúncio de medidas, como o repasse de R$ 7 milhões para ações de defesa em São Sebastião, é urgente que os governos preparem as cidades contra eventos extremos mais regulares e parem de culpabilizar as chuvas pelas tragédias.
 
Ainda que o acumulado de chuvas no período tenha sido o mais alto da história na região, com 640mm de chuva em apenas 24 horas, conforme os dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), não é correto culpabilizar o fenômeno natural pela tragédia. Os eventos extremos desta magnitude são mais frequentes devido ao aquecimento global, e o poder público além de tomar medidas para o cortar da emissão, deveria ter políticas públicas eficazes com participação das populações mais impactadas na elaboração, implementação e monitoramento para prevenção e adaptação. Inclusive o Cemaden alertou as cidades do perigo de chuva dois dias antes.
 
Para Rodrigo Jesus, porta-voz de Clima e Justiça do Greenpeace Brasil, as catástrofes atuais são reflexo de um modelo de urbanização historicamente excludente e escancaram a urgência do poder público priorizar ações de adaptação.
 
“É cíclico, racista e intencional a falta de políticas públicas de prevenção a catástrofes e adaptação de cidades com o histórico de fortes chuvas no país. O Brasil ainda reproduz um retrato colonial e sistêmico da falta de acesso e infraestrutura destinada ao povo periférico, negro e pobre. Ao invés de aprofundar e investir em medidas de adaptação para assegurar vidas a médio e longo prazo, o poder público continua apostando apenas em ações de resposta rápida no momento em que a catástrofe apresenta danos humanos”, ressalta Jesus.
 
Tragédias marcam a história do país
Segundo dados do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), nos últimos 35 anos foram registradas no Brasil, pelo menos, 4.219 mortes causadas pelas fortes chuvas em detrimento da falta de planejamento, infraestrutura e políticas adequadas contra eventos extremos. Petrópolis – RJ, Recife – PE e Araraquara – SP, recentemente, são apenas algumas das cidades que tiveram suas histórias marcadas por catástrofes que poderiam ter sido evitadas. Dados levantados pela Confederação Nacional de Municípios (CNM), em conjunto com Ministério do Desenvolvimento Regional, no ano passado, mostram que o número de mortes causadas pelas chuvas, e pela falta de infraestrutura no país em 2022 foi a maior nos últimos 10 anos.
 
Além disso, não é a primeira vez que São Sebastião é vítima de um evento extremo acompanhado pela negligência do poder público. Em 2014, a cidade recebeu 179mm de chuva em apenas dez horas, bloqueando trechos da Rodovia Rio-Santos, provocando deslizamentos, alagamentos e isolando praias do município. Nove anos depois, a cidade ainda não conta com infraestrutura adequada para a população, especialmente a parcela que vive em áreas de risco.

O que devemos esperar (e cobrar) do poder público
Os governos federal, estadual e municipal têm acompanhado de perto a situação em São Sebastião, mas é necessário que as promessas e reuniões se convertam em ações concretas e urgentes. Dentre as políticas públicas para áreas de risco já mapeadas, destacam-se a instalação de sistemas de alertas, como sirenes; ações de regularização e ordenamento de construção e moradia em áreas de risco; estabelecimento de centro de monitoramento e instalação de novas estações meteorológicas para controle de possíveis episódios extremos; desenvolvimento de planos de adaptação de cidades com uma lente de justiça climática e alinhamento com plano diretor dos municípios, caso existentes. Considerando metas claras, orçamento, revisão anual com participação pública, treinamento das populações sobre riscos e atuação em momentos de crise.
 
Apesar do Plano Nacional de Adaptação ter ciclos de vigência e último ano do ciclo em vigência encerrou em 2016, não há informações precisas e disponíveis sobre a sua avaliação e atualização. É urgente que sua revisão e implementação efetiva seja realizada o quanto antes e que garanta a inclusão da Justiça Climática como elemento central.
 
“Além de estar desatualizado e não ser efetivo, o plano é focado em ações de adaptação para reduzir a vulnerabilidade de setores econômicos e não há sequer uma menção à palavra justiça no seu extenso conteúdo. Povos e populações em situação de vulnerabilidade são um capítulo, e não um eixo central e transversal como deveriam ser. Ou seja, o plano vigente no Brasil busca apenas adaptar as vulnerabilidades dos setores da economia brasileira, da indústria e do capital, deixando para trás as pessoas vulnerabilizadas pelas mudanças climáticas”, ressalta Rodrigo.
 
Essas são algumas ações que garantem, de certa forma, a segurança de toda população e um planejamento de longo prazo, sem culpabilizar o grande volume de chuvas.
 
“O grande volume de água não justifica enchentes e deslizamentos de encostas que levam pessoas à morte. Não existe 'muita água para pouca cidade', mas existe sim falta de medidas de prevenção e adaptação eficazes, além da falta de comprometimento do poder público. O governo precisa agir”, finaliza Rodrigo.

Como ajudar
O Greenpeace Brasil apoia às populações mais afetadas pelas chuvas, denunciando a situação de calamidade pública que enfrentam e colocando pressão pública para que governos adotem medidas de prevenção e adaptação efetivas. Ao lado de parceiros locais, a organização está apoiando as famílias impactadas, através de uma plataforma para doação em dinheiro, fazendo chegar o que precisa para as famílias impactadas pelas chuvas.
 
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